Como entender Pókemon Go na vida de nossos filhos?

 

Leia abaixo na Íntegra, entrevista dada no Portal Boa Vida:

Pokémon Go, com o Psicólogo Dr. Danilo Suassuna

pokemon-go-vector-logoDepois de se tornar sucesso na América do Norte, Japão e em alguns países europeus, o Pokémon Go já pode ser oficialmente baixado no Brasil, desde o último dia 3. Criado para smartphones, o game de realidade aumentada tem dividido opiniões, ao provocar fatos curiosos e verdadeiros alvoroços pelo mundo. No Brasil, em menos de 24 horas, mais de 50 milhões de usuários já haviam aderido ao Pokémon Go.

Atento aos acontecimentos, o Psicólogo Danilo Suassuna, do Instituto Suassuna, comenta essa verdadeira febre digital. Danilo é doutor e mestre em Psicologia, autor dos livros “Histórias da Gestalt-Terapia – Um Estudo Historiográfico” e “Renadi – A experiência do Projeto Plantar em Goiânia” e coordena o Núcleo de Estudos e Pesquisa em Gerontologia (NEPEG), do Instituto de Treinamento e Pesquisa em Gestalt-terapia de Goiânia (ITGT).

 

Boa Vida Online – Qual a razão de ter tantas crianças, adolescentes e adultos procurando pokémons?

Dr. Danilo Suassuna – A Nintendo, empresa responsável pelo jogo, uniu tudo o que a gente tinha da antiguidade, acho que pokémon está em sua 8ª edição. Então, a empresa pega pessoas que hoje estão com 25, 26 anos, e une com as crianças de 8, 9 anos, em torno de um desenho.

A Nintendo tem mecanismos que fazem esses indivíduos, de diferentes gerações, retomarem a vivência com esse desenho que já esteve no passado e virou carta. Hoje, eles jogaram essa carta para dentro do celular.

 

Boa Vida Online – Você acredita que a sociedade de hoje é infantilizada?

Dr. Danilo Suassuna – Na verdade, não é uma infantilização. A minha perspectiva é a de que as pessoas estejam procurando fora de si, o que não estão encontrando dentro de si mesmas. Então, é muito mais fácil “eu” pegar um pokemon ali na esquina, que é uma realidade ampliada, do que “eu” entrar em contato com a minha realidade emocional, com o meu dia a dia vivido.

A Nintendo faz uma coisa muito legal, que é pegar esse adolescente, que gosta de jogos, e tirá-lo da frente do console, da frente dos computadores, para levá-lo para a rua. Tem ovinhos de pokémon que você pode desbloquear andando dois, cinco, dez quilômetros. Então, ele faz esse indivíduo se levantar do sofá e ir para as ruas.

 

Boa Vida Online – Na sua opinião, quais os efeitos sociais desse jogo?

Dr. Danilo Suassuna – O efeito social nocivo é que, às vezes, as pessoas podem se perder. Podem se perder, inclusive, da realidade em que elas estão vivendo, se descuidarem da segurança nas ruas e os perigos de acidentes, de assaltos, etc. Há relatos de pessoas que se despreocupam dos perigos, não prestam atenção no caminho. Então, quanto aos efeitos sociais desse jogo, existem coisas muito boas em torno do Pokémon, como a realidade ampliada, que nos traz diferentes tipos de compreensão acerca do nosso futuro. Mas, ao mesmo tempo, ela pode ser alienante.

 

Boa Vida Online – Quando o jogo passa a ser nocivo à saúde?

Dr. Danilo Suassuna – O jogo passa a ser nocivo à saúde quando se perde o limite de tempo e energia que se gasta nesse joguinho, assim como tudo na vida. Quando se perde a noção do que é real e do que é fantasia, corre-se o risco de se tornar alguém alienado e que passa o dia todo atrás de pokémon. É preciso estar atento para não trocar a realidade pelo mundo da fantasia. É o que os adolescentes chamam de “adolescente várzea”, que é aquele que não faz nada.

 

Boa Vida Online – Por que tanta gente foge da realidade palpável?

Dr. Danilo Suassuna – Porque a realidade palpável pode ser aquela em que você passa por diversos problemas, como financeiro, que é difícil de enfrentar. E não podemos nos esquecer de que existe aquela realidade não palpável, que se referem às nossas sensações e aos nossos sentimentos. Esses estão cada vez mais distantes de nós. Vi esses dias uma frase de uma paciente, na internet, que diz: “enquanto vocês buscam o Pokémon Go, eu busco o meu futuro”. Então, sim, às vezes as pessoas se alienam e deixam suas necessidades afetivas de lado, por conta de uma realidade virtual como essa.

 

Boa Vida Online – E quanto a ciberdependência?

Dr. Danilo Suassuna – Sim, mas caso o jogador tenha consciência da brincadeira, a realidade ampliada é um benefício para a sociedade, assim como a internet veio ser um benefício para nós, mesmo que tenha sido criada e aprimorada durante as guerras. Então, é uma coisa legal, você tira essa adolescente de casa, como já havia mencionado.

Mas, por outro lado, ele pode ser nocivo, se foge dos limites e caem na ciberdependência. Soube de um caso de uma escola, em que alunos, professores, diretor, coordenador, todos foram para o mesmo lugar, para saber o que estava acontecendo e capturar novos pokémons. Então, existe uma ciberdependência, sim. Estou ali do lado do indivíduo e não estou olhando para quem ele é. Isso é preocupante, estar ao lado do amigo e não enxergá-lo de verdade.

 

Boa Vida Online – A realidade é sempre menos atraente do que a ficção?

Dr. Danilo Suassuna – Na verdade, a ficção é a nossa fantasia. A ficção, às vezes, realiza o que a gente fantasia na vida real. Por isso, muitas pessoas gostam de filmes. O filme nada mais é do que um voyerismo, eu vivo a vida do outro, ali, através do cinema. Então, assim, não é de todo o mal. Mas a realidade é mais doída, porque tem muita gente que, infelizmente, não sabe o que deseja. Gente que fica correndo, mas que não sabe para que lado está indo; que se perde em si mesma, não consegue realizar os seus desejos pessoais. São pessoas que estão sempre infelizes. Geralmente dizem: “ah, estou louco para sexta-feira chegar”. Mas por quê?! Porque elas vivem uma vida ruim. Aí sim, a ciberdependência pode ser uma escapatória dessa vida real.

 

Boa Vida Online – Uma pessoa que se viciar em Pokémon tem tendência a vícios de outra ordem?

Dr. Danilo Suassuna – Na verdade, não é preciso chegar a tanto. Essa não é a grande pegada do Pokémon. Esse é apenas um jogo, com benefícios e prejuízos. O mais importante é a gente começar a observar o comportamento dos adolescentes, principalmente por parte dos pais; sinais que suspeitam desvios ou motivação para outros vícios.

 

Boa Vida Online – Temos as brincadeiras tradicionais, como pique-esconde, pular corda e tantas outras antigas, que estão praticamente esquecidas. Em tempos de Pokémon, é preciso retomar também essa outra infância, de atividades reais e mais coletivas, interativas? Os pais e educadores precisam se atentar pra isso?

Dr. Danilo Suassuna – Sim, é importante esse retorno, sabendo que não apenas as brincadeiras antigas, mas as atuais também são importantes, inclusive para socialização entre eles, uma vez que, se uma criança não tem o Pokémon, ela pode se sentir excluída.

 

Boa Vida Online – Os pais podem ajudar a mesclar todas as formas de brincar e auxiliar aos filhos nessa tarefa lúdica?

Dr. Danilo Suassuna – Na verdade, a responsabilidade, quando os filhos são pequenos, é dos pais. Eles devem ajudar a criança a desenvolver as brincadeiras nessa fase. Os que são ausentes perdem a oportunidade de ensinar a ter essa noção do limite dela mesma. E aí, isso, lá no final da adolescência e início da vida adulta, pode atrapalhar o indivíduo a saber quais são os seus limites e a lidar com as suas frustrações. Então, os pais têm co-responsabilidade nessa realidade.

 

Fonte: Portal Boa Vida